Hiflex

Compartilhar

Cynefin – Os três tipos de sistemas

Para aqueles que vem acompanhando essa jornada sejam bem-vindos de volta, aqueles que chegaram agora vou deixar como dica de leitura os 2 artigos anteriores a esse:

  1. Cynefin – O que é?
  2. Cynefin – Por que esse nome?

Hoje começaremos a nos aproximar da conhecida matriz 2×2, mas ainda não falaremos diretamente dela, citaremos indiretamente alguns dos nomes dos domínios para uma conexão com os tipos de sistemas existentes.

Antes de mais nada vamos a conceitos básicos, como por exemplo quando dizemos sistema, segundo Dave Snowden:

“Sistema significa qualquer rede de interação com coerência, o que significa que ela pode ter limites difusos”

Por limites difusos entendam uma das palavras chaves do Cynefin, restrições.

Temos dentro do sistema agentes que interagem que segundo Dave Snowden:

“Por agente, quero dizer qualquer coisa que atue dentro do sistema. Isso pode ser uma pessoa, uma comunidade, uma narrativa dominante, um processo ou uma regra”

Com isso vamos começar a falar dos 3(três) tipos de sistema e para nos auxiliar durante o processo utilizarei como exemplo o filme Sully – O Herói do Rio Hudson (Warner Bros).

Resumo do filme para colocar quem não assistiu ao filme no mesmo contexto, um comandante no começo do voo tem os motores danificados por aves e acaba sendo obrigado a pousar no rio Hudson salvando a vida de todos a bordo.

Com esse contexto vamos começar pelo sistema ordenado. No sistema ordenado temos as seguintes características:

  • Alto nível de restrição;
  • Relação linear de causa e efeito;
  • Processos repetitivos;
  • Retrospecção auxilia em previsão futura.

 

Vamos explorar melhor essas características. Neste sistema o comportamento dos agentes acaba restrito pela própria natureza do sistema, por exemplo um processo fabril, segue as mesmas etapas de forma repetitiva e linear, onde cada parte de um produto que é completada pode, ao ser desmontada, gerar o entendimento retrospectivo de sua causa e efeito. Com isso o comportamento do sistema é restrito a suas etapas, e qualquer tentativa de incluir novas restrições podem levar um sistema ao seu colapso.

Um contexto dentro do sistema ordenado é a ideia de utilização de checklist que deixa clara a linearidade existente. Mas aí começa o perigo…

Um sistema para ser considerado ordenado requer tempo, pois para atingimento desse patamar é muito custoso. Um exemplo são os Comandantes de aeronaves. Eles têm procedimentos que devem ser seguidos rigorosamente (um checklist) para que o voo seja seguro.

Figura 1- O verdadeiro Capitão Chesley “Sully” Sullenberger (à esquerda) e o 1º Oficial Jeffrey Skiles (à direita). Crédito: Reuters / Seth Wenig / Pool

Mas observem um detalhe interessante, foram anos de preparação e disciplina que tornaram os comandantes capazes de criar o checklist, que passou a ser seguido por outros comandantes como algo seguro e ordenado, mas não foi o checklist que os tornou comandantes.

Daí o cuidado que deve se ter de algumas práticas emergentes, particularmente as vinculadas a agilidade, serem tratadas como ordenadas (“É só seguir o checklist”) sem antes termos preparação e disciplina e um real conhecimento do contexto (outra palavra chave do Cynefin) de sua aplicação.

Vou dar um exemplo real de tratar algo como ordenado, sem o devido contexto, pode te levar ao caos…

Durante o incidente o comandante Sully e o 1º oficial Skyles seguiram o checklist, mas graças a experiência deles houve a percepção que o sistema não estava mais no ordenado e sim que eles haviam entrado no sistema caótico, e seguir o checklist seria catastrófico, daí a grande importância de contexto.

Chegamos agora do sistema caótico que tem as seguintes características:

  • Inconstante;
  • Temporal;
  • Ignorado te leva a uma crise catastrófica;
  • Bem manipulado é uma oportunidade para Inovação Assistida.

 

No sistema caótico tudo parece aleatório, é simplesmente uma bagunça. A queda acidental nesse sistema faz com que você tenha que decidir rapidamente ações para sair desse estado, ênfase em ação, não em solução, pois se você buscar soluções ao invés de agir, você acaba na falha/crise catastrófica e isso pode ser fatal.

Para sair desse sistema devemos criar alguma restrição para que retomemos o controle. Voltando ao nosso exemplo a percepção do contexto mencionado acima (contexto 2 motores queimados e baixa altitude) fez com que o comandante Sully e o 1º oficial Skyles agissem, considerando o contexto e incluindo a restrição de tempo e distância para alcançar aos aeroportos LaGuardia e Teterboro, fazendo com que ele tomasse a ação de pousar no rio Hudson, veja aqui a temporalidade em ação, você não consegue ficar muito tempo no caos, você precisa sair de lá. Porém as autoridades aéreas questionaram essa decisão afirmando que seria possível chegar aos aeroportos supracitados.

Figura 2 – Prepare-se para o impacto: Sully: Herói do rio Hudson mostra o pouso forçado em grande detalhe. Crédito: © WARNER BROS

Usando esse questionamento chegamos ao terceiro sistema o complexo-adaptativo que tem as seguintes características:

  • Possível simulação (Simulação não é previsão);
  • Retrospecção não é confiável;
  • Ambiente para inovação;
  • Transitório.

 

Neste sistema as restrições são moduladoras, e não direcionadoras, isso significa que conforme “modulamos” o sistema com novas restrições aprendemos mais sobre ele até o momento que podemos começar a considerá-lo ordenado.

Isso não é um processo rápido, pois cada interação dos agentes com o sistema faz com que ele se modifique, fazendo que experimentação, após experimentação cause a evolução do mesmo.

Retornando ao filme, após as autoridades questionarem as ações do comandante e de seu 1º oficial, simuladores são colocados em ação, e o resultado apresentado durante o julgamento é que seria possível pousar nos aeroportos próximos…

Então houve negligência?

Lembre-se que falamos que nos sistemas complexo-adaptativos simulação não é previsão, neste momento surge a seguinte pergunta:

“Por favor, pergunte quantas vezes praticaram no simulador? ”

”17 (dezessete) vezes”

Segunda pergunta antes de explorarmos o assunto:

“Vocês consideraram o tempo que perdemos seguindo o checklist? ”

“Não”

“Seu tempo de reação e decisão será estabelecido em 35 segundos”

Resultado… falha catastrófica…  O avião caia nos 2 (dois) aeroportos…

Reparem que após a repetição constante, aprendendo com as interações no sistema e seus agentes, eles conseguiram um resultado reproduzível, porém ao incluirmos novas variáveis o resultado deixou de ser reproduzível, isso nos remete que para inovação adaptativa precisamos de um ambiente seguro para falhas, no caso foram 17 (dezessete) simulações, que com qualquer variável nova deixaria de ser reproduzível.

Lembre-se que o comandante Sully só teve uma tentativa…

Após a queda no rio Hudson, e a saída do sistema caótico, a tripulação voltou ao sistema ordenado conduzindo, conforme seu treinamento e procedimentos (checklist), todos a bordo para fora da aeronave em segurança, onde as equipes de resgate os retiraram seguindo seus protocolos (checklist de novo).

Falar de ferramentas, metodologias ou frameworks antes de compreender o contexto de seu sistema e as interações dos agentes existentes nele acabam te levando a falha catastrófica, por isso estou compartilhando esses conceitos antes de mostrar a tão esperada matriz 2×2… espero que tenham paciência e continuem acompanhando…

Na próxima chegamos nos domínios então né? Quase lá, falarei sobre as restrições nos sistemas, e aí sim chegaremos…

Até a próxima!

Leandro Sanches
Agile Coach

Outras Publicações

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *