Tenho recebido muitas perguntas sobre o momento atual do mercado e da agilidade, incluindo perguntas como: “É o fim da agilidade?”; “Ainda tem espaço para os agilistas?”; “O sonho de um mundo melhor nos projetos acabou?”.
Diante destas e outras perguntas resolvi escrever este artigo para falar sobre a minha visão do momento atual, onde vou comentar um pouco sobre o porquê dos últimos lay-offs terem afetado o mercado de agilidade e porque afirmo que a infantilidade no ágil chegou ao fim. Também vou falar sobre o futuro e responder a outras perguntas como: “O mercado vai voltar a aquecer?”; “As contratações de agilistas vão ser retomadas?”; “Os trabalhos de consultoria e treinamento vão continuar tendo espaço?”; “O que está mudando e o que vai mudar neste mercado?”.
Então, fique até o final que tem bastante coisa interessante.
O lay-offs e seus impactos na agilidade
O mundo da agilidade infantil, romântica e dos pensamentos ligados ao movimento de abraçar árvores foi profundamente abalado este ano com a ocorrência de layoffs que afetaram as áreas de tecnologia da informação, gestão e agilidade.
Após os play-offs terem acontecido, muita gente se preocupou com o futuro da agilidade e dos profissionais conhecidos como agilistas, e eu recebi uma enxurrada de perguntas ligadas a isso. Então é bem importante começarmos com este tópico.
Primeiro, os lay-offs não aconteceram apenas em tecnologia, e muito menos apenas na agilidade, muito pelo contrário. Empresas inteiras foram afetadas, praticamente todas as áreas sofreram com cortes e reduções. O que muitas vezes acontece é que estamos olhando para uma bolha onde estamos inseridos e isso causa uma miopia que nos faz acreditar que só a nossa área foi afetada e todo mundo que conhecemos foi demitido. De novo, não foi! Ontem mesmo um amigo me disse que a empresa dele fechou e demitiu 600 funcionários, e detalhe, não tinha nenhum agilista e não tinha nada a ver com software ou TI.
Então, vamos separar as coisas e tratar deste assunto de forma bem objetiva. O mundo inteiro, não só o Brasil, ainda sofre economicamente com as consequências dos efeitos da pandemia, da guerra da Rússia e Ucrânia e de incidentes internacionais que afetam a economia interna dos países. Já o Brasil teve uma recente mudança de presidência que também afetou a todos, e nada tem a ver com ideologia ou teoria da conspiração, tem a ver com insegurança econômica.
Quando um governo muda, os investidores e empresários ficam inseguros de investir imediatamente e retém os investimentos, e em alguns casos até retiram investimento do país até haver certeza, ou mais garantia, de que nada de maluco ou absurdo irá acontecer. Foi isso que aconteceu no primeiro semestre deste ano no Brasil, e com isso muitas empresas nacionais e internacionais seguraram investimentos ou retiraram investimentos para proteger seus patrimônios dos riscos de perda. Isso é gestão e não política, ok? Com isso temos o primeiro elo da corrente quebrando.
Unindo a insegurança econômica as consequências da pandemia e guerra da Rússia e Ucrânia inúmeras empresas determinaram que cortes precisavam ser feitos, investimentos adiados e números melhorados, afinal, nenhuma empresa quer quebrar mesmo no meio de uma crise. Com isso é natural que as empresas olhem para os seus projetos, produtos e equipes e comecem cortando por onde faz menos falta e/ou traz menos retorno, é aqui que temos o segundo elo da corrente quebrando.
Muitos trabalhos de tecnologia e agilidade estão ligados a inovação, e é bem comum que um conjunto de inovações sejam seguradas em momentos de crise, e o investimento que seria destinada a uma parte da inovação fique guardado para eventuais necessidades para cobrir outras despesas e problemas que ainda estão por vir. O que muitos chamam de reserva de contingência.
Com isso, outro ponto importante que também gerou impacto neste primeiro semestre de 2023, foi o fato de muitos investidores que mantinham empresas de inovação que ainda não estavam dando lucro e eram mantidas apenas com investimento, resolveram tirar seus investimentos justamente devido a tudo isso que mencionei anteriormente, e este foi outro fator que inflou os lay-offs pelo mundo todo. Os mesmos investidores decidiram por investimentos mais cautelosos e uma disciplina mais rígida na hora de escolher onde investir.
Se você quiser ler mais sobre isso deixarei no final um link de um artigo da Forbes que fala justamente sobre isso. Com este ponto da inovação e startups podemos dizer que o terceiro elo da corrente se quebrou.
Por fim, não podemos esquecer que empresas precisam dar lucro e resultado e uma gestão que não olha para os seus times, produtos e projetos que mais dão lucram, comparam com os que não dão e toma decisão com base nisso, especialmente de priorização, investimento e foco de esforço e pessoas, é maluca ou cega. Por isso o último conjunto de pessoas que inflaram os lay-offs foram as que estavam em produtos, projetos e trabalhos que não estavam mostrando resultado e que não conseguiam se provar e se pagar, e é justamente neste grupo que entra a infantilidade e o romantismo do ágil, e com isso o quarto e último elo da corrente se quebrou e levou a demissão de muitos profissionais de agilidade (e de muitas outras áreas e especialidades, claro!).
Não há mais espaço para falar bonito e não entregar nada
As seguintes falas rasas e vazias não conseguiram evitar as demissões: “Fazemos agilidade para entregar valor, não temos que cumprir datas”; “Temos que entregar valor, não temos que controlar custos”; “Temos que entregar valor, não podemos comparar produtividade dos times”; “Temos que entregar valor, não podemos ser cobrados”; “Temos que ser felizes e entregamos valor!”. Vamos ser sinceros aqui, que valor é este? Melhor, que valor ERA este que estava sendo falado, defendido e supostamente entregue pelos times e squads ágeis por ai?
A grande verdade é que as empresas cansaram de ouvir esta balela de valor, felicidade, colaboração, mindset, e antes que você diga que há Burndown, Storypoints, throughput, leadtime, isso na maioria dos casos não é valor para o negócio e não mostra resultado real que pode manter um time, produto ou projeto rodando. Isso é só medição de eficiência de time, é medição da velocidade em que se está indo para algum lugar, mas que lugar é este?
Se não entra dinheiro, não pode sair dinheiro. Crianças é que não ligam para o fato de que seus pais precisam ganhar dinheiro para elas ganharem presentes, doces e comida. Adultos sabem que para o dinheiro sair, antes tem que entrar, e por mais que as empresas tenham saúde financeira para inovar e investir em novos produtos e serviços, este investimento tem limite, uma hora acaba, ou a crise tende a limitar este tipo de dinheiro.
Assim, podemos dizer que temos um quinto elo da corrente se quebrando, especificamente falando da agilidade, onde times enormes foram montados, SQUADS para tudo quanto é lugar, papéis e papéis criados, tais como: Product Owners, Business Owners, Product Managers, Tech Leaders, Scrum Masters, Agile Masters, Devs, Devops, Heads de tudo quanto é coisa, e o que estes times entregavam de resultado? O que mostravam além de históricos de melhoria de velocidade e eficiência de time e radares de maturidade que mostram só a aplicação de métodos?
Não devemos perseguir métodos, ferramentas, frameworks, SQUADs. Devemos perseguir resultado. Inclusive, escrevi um artigo e gravei um vídeo bem bacana sobre o problema que a criação desordenada e maluca das SQUADs gerou nas empresas, caso você não tenha visto acesse o link a seguir e confira:
Então, encerrando o tópico do lay-off. Os agilistas e os profissionais da agilidade entraram nos últimos lay-off pelos mesmos motivos que a grande maioria dos outros profissionais e áreas também entraram, por não entregarem resultado esperado pela organização. Simples assim, e por isso que temos que falar do presente e do futuro a partir de agora.
Momento Atual e a Agilidade
Já estamos percebendo uma melhoria do mercado e um aquecimento de prospecções, leads e contratações. É o começo do fim da insegurança econômica devido a mudança de governo, afinal o governo atual não fez nenhuma loucura. E é, espero, o reflexo do fim real dos impactos da pandemia, e assim como nos últimos dois anos, o primeiro semestre foi ruim e o segundo indica que será bem melhor.
Só para compartilhar uma realidade positiva com todos vocês, estamos com novas vagas abertas tanto para profissionais de Agile quanto para profissionais de projetos, e em subida.
Futuro da Agilidade e dos Agilistas
Bom, eu tenho uma opinião bem formada em relação a isso, e posso adiantar e afirmar que não é o fim do ágil, nem da agilidade e muito menos dos agilistas. Porém, teremos um equilíbrio necessário, que vai acabar de vez com a infantilidade e o romantismo que alguns impregnaram no ágil. Além disso vejo uma nova onda que está vindo por ai, que tem a ver com novas oportunidades e um crescimento do mercado de agilidade, no entanto um crescimento diferente. Vou explicar melhor.
Uma nova onda da Agilidade está iniciando, e separo esta onda em duas partes:
Nova Onda da Agilidade – Parte I
A primeira parte da nova onda da agilidade tem a ver com novas empresas que não estavam embarcadas na agilidade ainda, por questões de segmento e até mesmo pela natureza de seus trabalhos serem mais tradicionais do que o de outros setores, mas que agora estão vendo as possibilidades que a agilidade pode trazer para os seus times e negócios. Um exemplo claro disso é que recentemente eu e meu time realizamos trabalhos com uma empresa de embreagem automobilística com Scrum na parte de desenvolvimento de embreagem, não era TI, não era software, era embreagem física mesmo. Eu posso contar este case com mais detalhes se você quiser, deixe ai nos comentários se você quer saber mais sobre esta aplicação de Scrum na indústria que eu escrevo outro artigo contando.
Outros exemplos aconteceram este ano mesmo, onde estamos trabalhando com a Volkswagem Caminhões e Ônibus para implementação de agilidade na fábrica de caminhões e ônibus, de novo não é TI, não é Software, é indústria pura. Outro exemplo bacana, estamos atendendo a Kraft Heinz, a casa do Ketchup, e lá estamos trabalhando com Scrum, Kanban e times ágeis na melhoria e desenvolvimento de novos produtos, também na área de Tomates, de molhos, de embalagens, ou seja, indústria de novo, fábrica, pesquisa e desenvolvimento de produtos industriais.
Então, o que eu estou enxergando é que nesta nova onda estas empresas, que se colocavam mais como tradicionais e que ainda viam que o Ágil não poderia ajudar nos seus setores, estão entendendo e vendo que a agilidade tem muito a somar sim, e por isso estão vindo com força neste mercado e por isso eu acredito em novas oportunidades e um crescimento deste mercado ainda em 2023 e especialmente em 2024.
Nova Onda da Agilidade – Parte II
Temos então a segunda parte da nova onda da agilidade, que tem relação a agilidade séria, responsável e que precisa mais do que nunca entregar resultado e aqui fechamos todo o ciclo de raciocínio, do porquê falei de lay-off no começo deste artigo e do porquê do título falar de infantilidade.
Empresas que eu mencionei vão puxar a régua para cima, não querem saber de agilidade romântica, que fala de forma subjetiva sobre valor, e que as pessoas precisam ser blindadas de tudo que é ruim do mundo corporativo e das cobranças por resultado. Isso não existe, nunca existiu, e nem sei da onde veio esta falácia de que Ágil é felicidade, que Ágil não tem cobrança, que Ágil não tem cronograma, que Ágil não tem realidade e as pessoas vivem no país das maravilhas ou no belo e maravilho mundo do linkedisney.
Empresas são reais, resultados precisam ser reais, e a aplicação da agilidade precisa dar resultado real. Por isso a infantilidade acabou (ou o tempo de ser infantil acabou), o tempo agora é de falar de forma séria, responsável e principalmente adulta sobre agilidade. Perguntas como as seguintes precisam ser respondidas de forma objetiva:
- Que resultados a agilidade vai trazer para a empresa?
- Implementar um método ágil em um time vai trazer que tipo de ganho para o próprio time, para o seu produto ou serviço, para a sua área, para a sua empresa e para o seu cliente?
É disso que temos que falar. Não podemos mais ficar falando que métrica ágil é velocity, burndown, throughput, leadtime ou wip. Não podemos mais dizer que entregamos valor se não conseguimos provar este valor com números e evidências.
A Régua Subiu
É isso, a régua subiu! Os agilistas precisam sair dos seus jardins do Éden onde ficavam abraçando a sua Árvore das Almas como em Pandora no filme Avatar, e descer para o play. Os agilistas precisam mostrar que seus produtos e serviços geram valor, e quanto mais valor melhor para a sua sobrevivência dentro da empresa e para o futuro da agilidade e das práticas ágeis.
Esta nova onda mexerá com tudo, ao mesmo tempo que teremos oportunidades novas com empresas que não estavam querendo mexer com agilidade, e que agora querem porque acreditam que a agilidade pode trazer valor aos seus negócios. Porém, o valor será cobrado desde a venda, tanto que as vendas já estão mais difíceis, e vão ficar mais ainda, onde precisaremos cada vez mais mostrar o valor esperado pelos nossos trabalhos. Um Product Owner, Business Owner ou Product Manager, precisa mostrar o valor do seu novo produto ou da evolução de um produto anterior para mantê-lo em desenvolvimento. Um time precisa mostrar o que está gerando de valor para o seu produto, empresa e/ou cliente para se manter unido.
É isto. A infantilidade do ágil acabou e agora estamos na era dos resultados e das evidências de que a agilidade propõe melhorias e estas melhorias precisam ser medidas, apresentadas e influenciar diretamente nos resultados das empresas e de seus negócios, e não mais apenas na felicidade de um time que acha que o mundo gira ao seu redor.
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Valeu, fica com Deus e até o próximo post!
Referências:
Artigo sobre o mercado de Startups estar com menor investimento:
https://forbes.com.br/forbes-tech/2022/06/camila-farani-o-boom-dos-recursos-para-as-startups-acabou/